Luto paterno: como lidar com a perda de um filho?

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O luto paterno é um processo dramático na vida de qualquer um. A dor de perder um filho é, inclusive, citada por muitos como a mais intensa que existe. Essa perda exige que toda a estrutura familiar se modifique, mudando planos, sonhos e projetos.

Entretanto, a sociedade exige uma postura irrealista da figura paterna, devido a uma imagem estereotipada de masculinidade marcada por frases como “homem não chora”. O pai é visto culturalmente como o Alicerce da família, e há a falsa ideia de que ele deve ser sempre forte e indestrutível.

Para entender melhor o tema, conversamos com as psicólogas Ana Lúcia Naletto e Lelia Faleiros, especializadas em luto, que trabalham no Centro Maiêutica. Eles são, também, responsáveis ​​pelo treinamento dos colaboradores do Primaveras, além de atividades promovidas pelo grupo.

Continue a leitura para entender mais sobre o luto paterno com a ajuda de uma perspectiva profissional.

Por que a sociedade cobra força dos pais diante do luto?

A sociedade tem essa postura de cobrar uma força irreal de pais diante da perda de um filho, segundo os especialistas, em parte porque não se sabe como aliviar a dor sentida por eles no processo de luto .

A sociedade, no geral, (…) não suporta entrar em contato com tamanha tristeza de pais enlutados (…). Nossa sociedade ocidental moderna tem dificuldades em lidar com a finitude e com o sofrimento, por razões de negação da falta de controle diante da morte e por não saber como suportar o sofrimento, já que vive a exaltação a uma pseudo-alegria.

Essa cobrança é ainda mais forte para a figura paterna. Infelizmente, ainda há quem acredite que os homens sentem menos ou superam mais facilmente os acontecimentos dolorosos, em relação às mulheres.

Essa falácia tem muito a ver com o fato dos homens serem ensinados, desde cedo, a negar os seus próprios sentimentos. Há uma cobrança estrutural e cultural em relação à ideia de ser forte e de dar apoio à mulher, mesmo quando o homem está arrasado por dentro.

Como isso afeta o psicológico deles?

Devido a essa crença tóxica predominante em nossa cultura, que pode causar a expressão emocional dos homens, muitas vezes não tem luto validado socialmente. Isso impõe obstáculos para que esse processo seja vivenciado de forma saudável, como defendem Lelia e Ana Lúcia.

O luto do homem, muitas vezes, é transformado na adolescência física ou psíquica pela falta de espaço para sentir e expressar. Eles acabam chegando no médico por sintomas físicos decorrentes do estresse do luto — falta de ar, dor no peito, infarto, alterações hormonais, insônia, compulsões, entre outras coisas.

Esses sintomas físicos são conhecidos cientificamente como psicossomatização, que é quando o corpo começa a apresentar sinais de adoecimento devido a um intenso estresse psíquico. É comum que essa somatização aconteça quando um indivíduo não consegue lidar de forma adequada com o sofrimento.

Um médico observador e atento à psicossomática (…) pode ajudar bastante explorando na consulta se há acontecimentos importantes na vida do paciente e recomendando buscar ajuda adequada.

Por serem treinados para atender a um ideal de força e masculinidade, os homens comumente não se permitem aceitar e vivenciar a própria dor pela perda de um filho. Tem tendência a buscar meios de fuga do sofrimento, como:

  • mergulhar no trabalho;
  • guardar-se do ambiente doméstico, para não se deparar tanto com a ausência do filho ou filha;
  • anestesiar-se com bebida alcoólica, remédios ou até drogas ilícitas.

Fugir da dor, em si, já não é algo funcional, pois deixa pendências emocionais que vão aparecer de uma forma ou outra. Além disso, muitas das estratégias de fuga usadas causam danos à saúde física e à saúde mental, bem como prejuízos sociais e na relação com parceiros e outros familiares — o que tende a gerar solidão, intensificando a sensação de vazio.

Como um pai pode enfrentar o luto?

Buscar ajuda profissional é uma excelente estratégia para lidar com o luto e outros processos que causam sofrimento.

Existem, ainda, algumas iniciativas que envolvem grupos de apoio ao luto — inclusive projetos específicos sobre o luto do homem . O Primaveras também tem um grupo de apoio para pessoas em processo de luto.

Caso o luto seja negligenciado, ele pode evoluir para um quadro depressivo. Por isso, é fundamental permitir-se vivenciar o processo e buscar estratégias que os ajudem a fazer isso de forma saudável.

Para evitar que o luto vire depressão, é importante vivê-lo, alternando momentos de expressão de sofrimento com momentos de sofrimento da vida.

Como a família pode ajudar nesse período?

A perda de um filho muda para a ordem natural da vida. Não é à toa que essa é uma das vivências mais impactantes e dolorosas para um ser humano.

Ao enfrentar essa dor, a família é uma rede de apoio importanteíssima, como defendem Ana e Leila. Segundo as psicólogas, é possível ajudar um pai enlutado por meio de ações muito simples, como:

  • fazer companhia;
  • levar comida;
  • incentivo ao banho;
  • -se para cuidar da casa, dirigir ou resolver uma questão burocrática oferta;
  • ajudar financeiramente;
  • evitar cobranças.

Como ter forças para seguir em frente após a perda de um filho?

Primeiramente, é importante não se cobrar para “ter forças”. No entanto, como as entrevistadas pontuaram, deveriam-se alternar momentos de dar vazão à dor com tentativas de reconstruir a vida.

Manter a memória do filho vivo é uma boa forma de continuar. Encontrar um sentido para dormir é um processo longo, mas importante para melhorar. Outra coisa importante é olhar para quem está vivo — muitas vezes há outros filhos, pais e irmãos; Laços importantes que seguem vivos e são a razão para que uma pessoa não se afunde na dor.

Os profissionais defendem, também, que o apoio psicológico especializado em luto faz muita diferença nesse processo, tanto em sessões individuais como em grupos de apoio. Encontrar pessoas com uma vivência semelhante, mesmo que para conversar em particular, também é de grande ajuda:

Outra sugestão é procurar conversar com pais que também viveram essa experiência. Essa troca é muito rica porque eles falam de um mesmo lugar, e é possível ver o que dá para sobreviver, é possível ver como cada um está cuidando da sua dor e buscando alternativas.

O luto é uma experiência para a vida toda, ou seja, uma pessoa que perde querido alguém carrega sua história de perda para sempre. Contudo, a forma como isso se manifesta muda ao longo do tempo: o sofrimento, aos poucos, dá lugar à acessibilidade , à saudade e às lembranças boas.

O tempo dessa transição é diferente para cada um, pois depende de muitos fatores, como traços de personalidade e a forma como o falecimento aconteceu. Mas um fator fundamental para que ela aconteça mais rapidamente é viver o luto da forma mais saudável possível.

O luto paterno certamente é um processo muito trabalhoso e doloroso. É preciso respeitar o próprio tempo e acolher a dor, mas, ao mento tempo, entender que é possível seguir em frente e buscar formas de se reerguer sem se cobrar tanto.

Rememorar é uma forma saudável de viver o luto, sem fugir dos próprios sentimentos. Para ver algumas dicas de como fazer isso, confira nosso post sobre como guardar memórias afetivas .

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2 thoughts on “Luto paterno: como lidar com a perda de um filho?

    1. Olá, Sandra
      Sentimos muito por saber que você está passando por um momento tão difícil. Perder um filho é uma experiência devastadora e sem dúvida uma dor inexplicável. Neste momento, é importante buscar apoio emocional de amigos, familiares ou até mesmo profissionais especializados. Se precisar de alguém para conversar ou compartilhar seus sentimentos, estamos aqui para ajudar.
      Se você estiver interessada, o Grupo Primaveras oferece um grupo de apoio que pode ser uma fonte valiosa de conforto e compreensão. Através do link: https://www.primaveras.com.br/grupo-de-apoio/ , você pode se cadastrar gratuitamente e participar desse espaço acolhedor. Entendemos o quão difícil é seguir em frente após uma perda tão significativa, e estamos aqui para oferecer nosso suporte. Nossos sentimentos mais profundos.
      Grupo Primaveras 💚

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